Somente com o amor se
reduzem as distâncias que nos separam dos outros, distâncias e diferenças que
não se anulam, mas somam.
Deus
cria distinguindo, separando, colocando de certa maneira uma distância entre as
coisas: a luz e as trevas, a terra e o mar. As coisas começam a existir quando
saem do caos, e quanto mais uma coisa é clara e definida, tanto mais existe.
Muitas
consequências derivam deste princípio: a primeira é que tudo aquilo que existe
tem um espelho duplo. As coisas vão de dois em dois, tudo aquilo que existe
provém de um duplo original e se as coisas existem na separação é verdade que
continuamente desejam voltar àquela unidade, como o sol e a lua que eternamente
se seguem no céu, como Adão e Eva, que uma irresistível força empurrará sempre
um ao outro, apesar de toda a guerra dos sexos.
Mas
se a distância foi criada por Deus, quer dizer que é boa. Sem a distância, sem
a diferença que se caracteriza como indivíduo, não existiria identidade, nem
liberdade.
A
criança descobre a si mesma distinguindo-se da mãe, o amor é sadio e verdadeiro
quando sai do estado de fusão típico da adolescência.
Os
indivíduos só são livres porque são padrões de si. Sem distâncias entre nós
viveríamos em uma mistura indistinta que aboliria cada liberdade pessoal. Solidão
e responsabilidade são o preço a pagar para ter identidade e liberdade.
Assim
agem em nós duas forças contrastantes: uma aspiração à identidade, que cria o
desejo de distinguir-me, ou seja, de separar-me; e uma aspiração à unidade, que
coloca o desejo de aproximar-me e assim eliminar as diferenças.
Entre
as distâncias que nos definem existem alguns lugares nossos e outros criados
diretamente por Deus, sobre o qual não podemos fazer nada. Podemos chamar estas
últimas as nossas dimensões existenciais.
São
princípios absolutos, ou seja, deveriam ser elementares e evidentes, mas muitas
vezes são esquecidos, ou negados.
O
primeiro princípio de existência é: eu estou aqui. O que significa obviamente
que não estou ali. Isto cria uma distância e uma separação entre aquele daqui e
aquele de lá. Se eu estou aqui e você ali, significa que eu não sou você e você
não sou eu, que os nossos interesses, embora possam convergir em algumas coisas,
serão sempre diferentes.
O
segundo princípio de existência é: eu sou agora. O que significa que não sou
amanhã, nem vinte anos atrás. Cada um de nós é o fruto de uma história e cada
história com base ao primeiro princípio é diferente. Podemos fingir que não a
vemos, mas a nossa história nos define e nos condiciona.
O
terceiro princípio de existência é: eu sou um corpo. Não sou portanto uma pura
vontade, um espírito, sujeito somente à própria escolha e à própria liberdade,
mas vivo em um complexo bioespiritual que me precede e me determina: sou homem,
sou alto, sou robusto, etc.
Estas
três dimensões nos identificam na natureza, no tempo e no espaço.
Existe
depois uma quarta distância que me define e é, em certo sentido, transversal às
outras três e as inclui. Poder-se-ia exprimir na simples fórmula: eu não sou
Deus. É portanto a distância estabelecida entre criatura e Criador que faz de
nós inevitavelmente seres dependentes. Nós não nos damos a existência sozinhos,
portanto somos destinados a existir na mendicância do ser, portanto somos
felizes somente se obedecemos.
Quebrar
as raízes das quais viemos significa condenar-se a uma vida sem razão, nem
sentido. Na verdade existem duas vias para superar esta distância e construir
uma verdadeira unidade, libertadora e não constritiva, uma natural e uma
sobrenatural.
A
via natural é aquela da amizade
A
amizade não quer abolir a distância, não finge que não existam diferenças, mas
carrega o peso de um trabalho necessário para superá-la. Este trabalho não nega
a distância, implicitamente a afirma e a reconhece como boa, em um esforço de
preencher esta lacuna.
A
dificuldade com a qual dois amigos teimosamente recomeçam continuamente uma
discussão no esforço de encontrar um acordo é um bom exemplo disso: não podem
resignar-se a serem divididos, nem mesmo querem se violentar, portanto refinam
continuamente o próprio pensamento na desgastante busca de uma verdade comum
que permita salvaguardar a unidade sem sacrificar a liberdade e a consciência
de cada um.
A
via sobrenatural é aquela da graça, que encontra o seu protótipo na comunhão
eucarística. Quando o meu corpo se une ao Corpo de Cristo é abolida cada
distância entre o meu ser e aquele de Jesus, eu me torno literalmente parte
Dele.
Isso
não diz somente da nossa relação com Deus, mas também o nosso relacionamento
entre nós. De fato, na medida em que sou fascinado por Cristo e seduzido por
Ele, posso superar cada diferença que se coloca entre nós, como escreve São
Paulo: “não existem mais judeus, nem gregos, nem escravos, nem livres, nem
homem, nem mulher”.
Não
somos nós que cortamos a distância, mas esta foi preenchida em um momento não
do nosso trabalho, mas da graça de um dom não merecido de Deus, porque no
encontro com Ele experimentamos um fascínio que povoa todo o nosso ser fazendo
de nós “novas criaturas”.
Nenhum comentário:
Postar um comentário