“Em uma planície muito, muito distante, viviam um urubu e um pavão.
O urubu-de-cabeça-preta, um
desses abutres do Novo Mundo, estava alegre, pois tinha acabado de sair de uma
corrente térmica quentinha. Bonito, vistoso, de plumagem preta e brilhosa, como
águia, erguia sua cabeça depenada e rugosa ao horizonte.
Com visão privilegiada e
olfato apurado, não era fã da carniça. Preferia a pupunha e as sementes.
Não era um exemplo de ave
perfumada, é verdade, mas estava longe de ser malcheiroso como seus colegas de
voo.
E também havia o pavão. Da
sua parte, preferia as frutas, as sementes e os insetos. Dono de uma cauda
exuberante branca, púrpura, verde, amarela e azul cintilantes, assim como o
urubu, nunca admitia em público fraquezas da autoestima.
A solidão da planície,
todavia, guardava seus mistérios e, um dia, ambos se encontraram para uma
conversa em um galho em comum.
Começou o pavão:
– Sou a ave mais bonita do
mundo animal, tenho uma plumagem colorida e exuberante, porém, nem voar eu
posso, de modo a mostrar minha beleza. Feliz é você, urubu, que é livre para
voar para onde o vento o levar
O urubu-de-cabeça-preta
pensou, no início, tratar-se de provocação. Calou-se.
Entretanto, seguiu-se a
lamúria do belo pavo, ecoando pelos campos, e chegando aos seus ouvidos
alertas. O cabeça enrugada, apesar do elogio, não celebrou.
Pelo contrário, ele também
tinha os seus dilemas. E, em vez de agradecer, murmurou:
– Que infeliz ave sou eu, a
mais feia de todo o reino animal e ainda tenho que voar e ser visto por todos.
Quem me dera ser belo e vistoso tal qual você, pavão
Foi quando, ao mesmo tempo,
os vizinhos tiveram uma brilhante ideia: por que não atingir a ave perfeita,
promovendo o cruzamento entre pavão e urubu?
– Seria ótimo! Nosso
descendente voaria como um urubu e teria a exuberância do pavão, proferiram em
uníssono
Então cruzaram, cheios de
esperança. E esperaram pelo nascimento do primeiro rebento.
No dia do parto, a planície
se encheu de expectativa. O filhote veio envolto em uma fralda, na boca de uma
cegonha branca. Ao desenrolar-se, o esperado bebê chocou a todos. Era um
barulhento peru – feinho, feinho, e desprovido da dádiva de voar.
Moral da história: se a
situação está ruim para você, não procure o caminho mais fácil, porque só
piora.
Por (Marc Tawil)
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