Madiba foi símbolo da luta
pela liberdade na África e no mundo inteiro, mas também teve atuações duvidosas.
No dia 5 de dezembro,
faleceu Nelson Mandela, histórico líder do movimento contra o apartheid na
África do Sul e primeiro presidente realmente eleito por todo o povo
sul-africano. Nelson Rolihlahla Madiba Mandela nasceu na África do Sul, em 18
de julho de 1918, descendente de um ramo secundário da família real Thembu, uma
tribo Xhosa. Madiba é o nome do seu clã familiar. Rolihlahla, em Xhosa, quer
dizer “aquele que traz problemas”. Graças ao status da sua família, Mandela foi
admitido na Fort Hare University de Alice, um instituto reservado à elite
negra.
Seu primeiro e corajoso ato
de liberdade data de 1940, quando descobriu que sua família, seguindo uma
tradição ainda em uso na África, havia arranjado seu casamento. Mandela não
quis se casar com a mulher escolhida, atraindo para si a reprovação geral.
Ainda hoje, na África, não é fácil discutir com a autoridade dos idosos e
violar as tradições tribais. Naquela época, isso era impossível, se a pessoa
quisesse continuar fazendo parte do clã e da própria tribo.
Mandela só podia ficar e
obedecer, ou ir embora antes de sofrer um castigo severo (e, de qualquer
maneira, o afastamento forçado). Ele decidiu fugir. Voltou a Joanesburgo, onde,
já privado do apoio familiar, para poder se manter trabalhou como guarda
noturno. Em 1943, conseguiu se matricular na Faculdade de Direito da
Universidade de Witwatersrand, sendo o único estudante negro. Nesse mesmo ano,
uniu-se ao AfricanNationalCongress, ANC, partido nascido em 1912 para defender
os direitos da população negra e, em 1944, contribuiu na fundação da liga
juvenil do partido.
Em 1948, com a vitória
eleitoral do National Party, que governaria até 1994, o regime do apartheid
tomou definitivamente forma e Mandela, que exercia a profissão de advogado,
destacou-se desde o começo entre os personagens mais relevantes na luta contra a
segregação étnica. Em 1952, foi eleito presidente do ANC. Entre 1952 e 1961,
foi preso diversas vezes por atividades sediciosas. Em 1962, foi acusado de
sabotagem e conspiração para derrocar o governo e, portanto, condenado à prisão
perpétua.
Ele passou 27 anos preso e,
nesse tempo, tornou-se um mito, símbolo da luta contra o apartheid. Libertado
em 1990, também graças às pressões internacionais, Mandela foi eleito
presidente do ANC, que chegou à vitória em 1994, nas primeiras eleições
democráticas do país, com o sufrágio estendido a todas as etnias.
Em 1993, junto ao presidente
sul-africano Frederik Willem de Klerk, recebeu o Prêmio Nobel da Paz. Eleito
presidente da república em 1994, formou um governo de unidade nacional, deu ao
país uma nova constituição, criou a Comissão Verdade e Reconciliação
(encarregada de investigar as violações dos direitos humanos cometidos durante
o regime do apartheid), iniciou uma reforma agrária e programas de luta contra
a pobreza e melhoria do sistema de saúde. Em 1999, recusou um segundo mandato
presidencial.
O mito de muitos líderes
africanos, aclamados como heróis da luta pela independência, venerados como
“pais fundadores” das suas nações, não durou muito: conquistado o poder,
revelaram-se depois cínicos, irresponsáveis e desenfreadamente corruptos,
dispostos a desencadear guerras civis e inclusive genocídios para conservar o
controle do Estado e ter acesso às riquezas nacionais, sem importar-se com o
destino dos seus compatriotas.
Não foi assim com Nelson
Mandela, que conservou até o final o carisma e a aura que o cercaram durante
décadas, e uma imagem discreta, moderada e íntegra também quando seu partido, o
ANC, degenerava, de escândalo em escândalo, e uma luta pelo poder, até entregar
o país ao atual presidente, Jacob Zuma, eleito em 2009, apesar das acusações de
corrupção, fraude e lavagem de dinheiro, bem como por uma vida privada discutível,
entre outras coisas.
Quando Mandela, há tempos
afastado do cenário político, surgiu inesperadamente ao lado de Zuma, durante
uma reunião do ANC para apoiar o candidato à presidência, muitos se
perguntavam: Madiba, você lutou por isso? [Nota do editor: durante o seu
mandato, também foi aprovada uma polêmica lei do aborto, que, entre outras
coisas, atenta contra a liberdade de consciência. A Igreja Católica se opôs
radicalmente a tal lei].
Mandela viveu até ver a
polícia do governo guiado pelo seu partido atirar e matar os mineiros em greve,
não uma, mas três vezes em menos de um ano. Em agosto de 2012, na mina da
Lonmin, em Marikana, 34 mineiros morreram assim: foi o mais sanguinário uso da
força contra civis por parte da polícia sul-africana desde 1960 e do final do
apartheid, comparada com a matança de Sharpeville, em pleno regime do
apartheid, quando as forças da ordem atiraram matando 69 pessoas.
Em 1994, o slogan da ANC era
“Uma vida melhor para todos”. Mandela deixa, no entanto, um país no qual um
terço da população e mais da metade das crianças vivem abaixo da linha da
pobreza e no qual, desde o final do apartheid, a taxa de desemprego aumentou
até superar 25%, assim como a diferença entre ricos e pobres.
(Artigo de Anna Bono,
publicado originalmente em La Nuova Bussola Quotidiana) sources: La Nuova
Bussol
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